segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

“Parques de papel”, a quem interessa?

Rio, 8/jan/09 – Segundo Rômulo Mello, presidente do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), apenas 16 das 299 reservas ambientais (unidades de conservação) criadas no País têm gestão considerada satisfatória. Demorou, mas o órgão governamental responsável pela administração das reservas ambientais acabou por reconhecer que 95% delas não passam de “parques de papel”. O mais notável é que na Amazônia, que abriga as maiores áreas ‘reservadas’, só existe uma delas considerada com gestão satisfatória – a Flona de Tapajós. [1]
Cálculos do ICMBio revelam que é necessário investir R$ 3 milhões, em média, para a consolidação de cada unidade de conservação ("Isso sem contar os custos da regularização fundiária"), o que leva a uma estimativa de mais de R$ 700 milhões para consolidar todas elas. Nem assim o ministro de Meio Ambiente Carlos Minc sentiu pejo em anunciar, esfuziante, a criação da reserva ambiental de no. 300: a Área de Proteção Ambiental da Serra da Meruoca (CE).
O problema é que, mesmo sendo parques de papel, tais reservas têm atravancado a viabilidade de inúmeros projetos de infra-estrutura e outros empreendimentos produtivos, mormente na cobiçada Amazônia.
O quadro se torna dantesco quando, aos parques de papel, criados ou em gestação, somam-se as reservas indígenas. Considerando-se o universo dessas áreas, uma pergunta se impõe: Qual a disponibilidade de terras para ampliar a produção de alimentos e energia, para a reforma agrária, para o crescimento das cidades e a instalação de obras de infra-estrutura no Brasil?
Quem perguntou e responde é a Embrapa Monitoramento por Satélite: em termos legais, apenas 29% do país seria passível de ocupação agrícola uma vez que cerca de 71% do território está legalmente destinado a minorias e a proteção e preservação ambiental. Como na realidade, mais de 50% do território já está ocupado, configura-se um enorme divórcio entre a legitimidade e a legalidade do uso das terras e muitos conflitos. [2]
Diz ainda a Embrapa:
Nos último anos, um número significativo de áreas foram destinadas à proteção ambiental e ao uso exclusivo de algumas populações, enquanto uma série de medidas legais restringiu severamente a possibilidade de remoção da vegetação natural, exigindo sua recomposição e o fim das atividades agrícolas nessas áreas. A pesquisa da Embrapa mapeou, mediu e avaliou, pela primeira vez, diversos cenários de alcance territorial dessa legislação no Brasil, com base em imagens de satélite, cartografia digital e dados secundários.



Embora várias leis e iniciativas visassem a proteção ambiental, elas não contemplaram as realidades sócio-econômicas existentes, nem a história da ocupação do Brasil. A perda de governança e os conflitos territoriais tendem a agravar-se dada a demanda adicional por novas terras da parte de vários segmentos da sociedade.

A demanda ambiental para a criação de novas UCs, corredores ecológicos, áreas de restauração ecológica e conservação prioritária da biodiversidade visa quase 3.000.000 km2. A demanda de terras para colonização, assentamento e reforma agrária é da ordem de 2.900.000 km2. A demanda para criação e ampliação de terras indígenas situa-se entre 50 e 100.000 km2. A demanda de áreas para quilombolas chegaria a 250.000 km2. A demanda agrícola para expansão de alimentos e energia até 2018, mesmo com a conversão de pastagens em áreas agrícolas e ganhos de produtividade, situa-se entre 100.000 e 150.000 km2. Essa demanda adicional representa quase 6.500.000 km2, uma área equivalente a soma dos territórios da Argentina, Bolívia, Uruguai, Peru e Colombia. Além disso, há de contar-se as demandas do crescimento das cidades, da infra-estrutura viária, industrial e energético-mineradora, a exemplo da implementação das obras do Programa de Aceleração do Crescimento – o PAC. É fisicamente impossível conciliar o uso atual e atender a totalidade das demandas futuras. [...]

A prosseguir o quadro atual de ilegalidade, de insegurança para as atividades produtivas, a falta de ordenamento territorial e o confronto entre exigências ambientais e a legitimidade de demandas sociais e econômicas, todos perdem.

Na raiz da criação da maior parte dessas reservas ambientais e indígenas se encontram ONGs internacionais, ou suas ramificações e aliados locais, de perfil nitidamente corporativo e que usam a carta ‘socioambiental” como atividade-meio para o seu negócio. Elas costumam ser regiamente financiadas por um amálgama de instituições governamentais e ‘filantrópicas’ com os mais variados interesses, inclusive, os de natureza econômica e geopolítica. Isso posto e documentado, fica a outra pergunta: a quem interessa a criação de gigantescos “parques de papel” estrategicamente localizados?

Notas:
[1]Apenas 5% das unidades de conservação do país têm gestão adequada, Radiobras, 19/12/2008
[2]www.alcance.cnpm.embrapa.br/conteudo/resumo.htm, capturado em 07/01/2008

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